A difícil gestão da memória histórica em Atenas, libertada do jugo nazista há 80 anos
Atenas celebra, neste sábado (12), os 80 anos da libertação da ocupação nazista, com um trabalho de memória histórica em parte incompleto e dificultado durante décadas pela herança da guerra civil entre os comunistas e seus adversários.
No centro de Atenas, a antiga sede da Gestapo abriga hoje um centro comercial.
Apenas um monumento discreto recorda que nesse local estavam os escritórios e um centro de tortura da polícia secreta nazista durante a ocupação da Grécia, de 1941 a 1944.
Milhares de resistentes foram torturados e assassinados durante um dos períodos mais traumáticos da história contemporânea grega.
"Em outro país europeu, esses locais seriam um museu", disse à AFP Menelaos Charalampidis, historiador especializado na Ocupação.
Os locais de memória desse período "não são ressaltados o suficiente, e no caso de alguns acontecimentos maiúsculos, nem sequer há monumento", afirma Charalampidis.
Em Atenas, a euforia da libertação durou pouco, ao ver-se eclipsada em questão de semanas pela violência entre as forças da ordem, de tendência conservadora, e os comunistas, um componente essencial da resistência grega.
Em meio à disputa para delimitar as esferas de influência ocidental e soviética, os britânicos enviaram tropas em dezembro de 1944 a Atenas para enfrentar os comunistas nas ruas, e a escalada desembocou em uma guerra civil (1946-1949) perdida por esses últimos.
A Grécia se consolidou como um país do bloco ocidental, mas viveu décadas difíceis que levaram à ditadura dos coronéis (1967-1974), implacável em sua repressão contra a esquerda.
"A guerra civil na Grécia, assim como na Espanha, traumatizou profundamente a sociedade. E isso impediu de abordar certos acontecimentos passados", resume a historiadora Tassoula Vervenioti.
"A resistência nacional contra os nazistas na Grécia, com um forte componente de esquerda, se viu condenada ao esquecimento pelo enfrentamento feroz entre os partidos de direita e os comunistas", durante a Guerra Fria, acrescenta Menelaos Charalampidis.
Tanto que foi somente em 1981, com a chegada ao poder do primeiro governo socialista de Andreas Papandreou, que a “resistência nacional” foi oficialmente reconhecida.
- Os estragos da fome -
Em 12 de outubro de 1944, o Exército Popular de Libertação Nacional (Elas), um movimento que durante anos travou uma guerra de guerrilhas contra os alemães, desfilou na praça Syntagma, em frente ao Parlamento, sob os olhares de milhares de pessoas.
Foi o fim de uma ocupação devastadora, na qual o Exército alemão submeteu o país a sangue e a fogo.
Em toda a Grécia, calcula-se que 250.000 pessoas morreram de fome, das quais 45.000 em Atenas e no Pireu. Os nazistas exterminaram 86% da comunidade judaica grega, concentrada em Tessalônica e com um forte componente sefardita.
Em sua obra de referência "Inside Hitler's Greece: The Experience of Occupation, 1941-44", o historiador britânico Mark Mazower explica que a crise de fome foi resultado da "incapacidade do governo colaboracionista grego (...) de abastecer Atenas" e da destruição da rede de transportes.
No entanto, o interesse dos atenienses pelo seu passado cresceu, com muitos participando, por exemplo, das “caminhadas históricas” de Menelaos Charalampidis, seguindo os rastros da ocupação nazista da cidade.
E.Magrini--PV